quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Escritos de corredor para corredor



Reproduzo aqui a resenha "De Corredor para Corredor" publicada na edição de setembro da Contra-Relógio.

Apesar de ter sido escrito há 33 anos atrás e de ter referências a campeões da época, "Era uma vez um corredor" ainda captura sensações que nós corredores sentimos. Difícil não ser afetado por ele.

Veja bem: a distância é tipicamente americana – 1 milha. O ambiente universitário, de disputas e camaradagem também. As músicas citadas - nunca ouvi. Mas o que faz tão especial? A capacidade do autor em descrever com exatidão as dificuldades e as sensações pelas quais Quenton Cassidy, o protagonista, passa durante seus treinos e provas.

O autor, o norte-americano John L. Parker Jr, que foi um excelente corredor e amigo de Frank Shorter (vencedor da Maratona dos Jogos Olímpicos de Munique, Alemanha), escreveu e publicou o livro por conta própria em 1978 e era estocado no porta-malas do carro e vendido pelo mesmo. O livro foi tão lido e procurado que por fim acabou sendo publicado por uma editora convencional.

A história é basicamente sobre a busca de Quenton Cassidy em se tornar um campeão e de todos os sacrifícios que tem que fazer para chegar lá, com a ajuda de um amigo que vira seu técnico. Pessoalmente, fiquei com vontade de testar meus próprios limites após virar a última página. O livro é cheio de referências a corredores de expressão, como o próprio Frank Shorter, Roger Bannister, Paavo Nurmi, Kip Keino, entre outros.

A tradução, a cargo de Claudio Figueiredo, é digna de elogios. Todos os termos relacionados a ritmo, distância e “tecnicismos”, aos quais nós, corredores, estamos acostumados, foram respeitados – o que é pouco comum. O autor publicou uma sequência do livro há cerca de 3 anos, chamada “Again to Carthage” (“De volta à Cartago”, em português) em que o protagonista larga a corrida, mas decide voltar a treinar, agora para disputar uma vaga na maratona das Olimpíadas. Contatada, a editora ainda não tem planos para publicá-lo.
TRECHO

“Depois da décima quinta série de quatrocentos metros, teria de pensar por um momento para se lembrar do próprio nome. Mas agora ele tinha seus quatrocentos metros inteiros de descanso, que corria com pequenos passos, saboreando cada instante. Sua mente deixou a condição neutra e se deliciou num estado de espírito de frivolidade. Estava morrendo de sede; a língua tinha colado no céu da boca e não precisava mais cuspir os tufos brancos de saliva congelada, pois não havia mais nenhum.”

SERVIÇO
“Era uma vez um corredor”, John L. Parker Jr. (Editora Intrínseca; 246 pags.; R$ 29,90)